Flip 2019: Walnice Nogueira Galvão faz crítica social ao homenagear Euclides da Cunha na abertura da festa
''Os Sertões' tem que ser lido todos os dias para se entender o que está acontecendo com os pobres no país', diz Galvão. Festa Literária Internacional de Paraty começou nesta quarta-feira (10) e vai até domingo (14). Walnice Nogueira Galvão abre a Flip 2019 nesta quarta-feira (10) Walter Craveiro/Divulgação Sentada com papéis na mão e anos de histórias na cabeça, a professora emérita da Universidade de São Paulo (USP) Walnice Nogueira Galvão abriu a 17ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) na noite desta quarta-feira (10). Euclides da Cunha (1866-1909), autor de "Os Sertões", é o homenageado da edição de 2019. FOTOS: Flip 2018 VÍDEO: 5 temas da Flip Galvão aproveitou o tema para criticar a violência da sociedade brasileira atual e outros períodos da história do país, principalmente o regime militar (1964-1985). “Enquanto o processo de modernização capitalista não terminar e não se passar para outra etapa histórica, ‘Os Sertões’ tem que ser lido todos os dias para se entender o que está acontecendo com os pobres no país.” “A nação promove uma guerra sem quartel contra os pobres, como o genocídio de jovens negros na periferia de São Paulo, a militarização das favelas no Rio, e os desastres de Mariana e Brumadinho, por exemplo”, disse a escritora, aplaudida por um auditório cheio. Ela também cutucou a desigualdade social no país. “Sempre me perguntam fora do Brasil o que tem a ver ‘Os sertões com o movimento dos sem-terra. Tem a ver com a falta da reforma agrária, a iniquidade da distribuição de terras no Brasil, a iniquidade geral da distribuição de tudo no Brasil”. Mas o discurso de mais de uma hora não foi político. O tom crítico social surgiu apenas no final de sua fala, quando exaltou a atualidade da obra do escritor. “Estudar e investigar Euclides da Cunha não se restringe a ‘Os sertões’ e nem apenas a sua obra, mas a todos nós.” Flip escolar Após dois anos com performances emocionadas lideradas por Lázaro Ramos (2017) e Fernanda Montenegro (2018), a feira optou por uma abertura quase escolar, com retomada histórica da Guerra de Canudos, grande tema de “Os Sertões”, e da formação política do Brasil. A professora detalhou o processo de investigação que trilhou em sua pesquisa de livre-docência sobre o escritor. Para entender a cobertura de Euclides, enviado especial do jornal “O Estado de São Paulo” para a guerra, ela analisou a cobertura jornalística da época. “Não foi Donald Trump que inventou as fake news, talvez tenhamos este privilégio”, brincou ao analisar a produção jornalística sobre guerra na época. “O noticiário não poderia ser menos imparcial. Quase todos os repórteres eram militares, alguns combatentes. É de admirar que Euclides tenha conseguido escrever, insistindo que a campanha foi ‘um crime’.” Ela também abordou aspectos técnicos do escritor. “Euclides emendador obsessivo compulsivo” foi como a professora classificou o autor, citando as 10 mil substituições que ele fez após a publicação do livro, de “vírgulas vagabundas” a “crases abusivas”, segundo ela. Galvão chegou a Euclides após fazer sua tese de doutorado sobre o escritor Guimarães Rosa. “O tempo todo eu encontrava rastros de Euclides da Cunha na obra de Guimarães Rosa”, contou. Para Galvão, “'Os sertões' é um totem e um tabu da cultura brasileira”. Walnice Nogueira Galvão subiu no palco após falas do arquiteto Mauro Munhoz, diretor-presidente da Associação Casa Azul, responsável pela Flip, e da editora Fernanda Diamant, curadora da festa. Munhoz agradeceu a todos os apoiadores e trabalhadores da feira e citou o “pouco recurso” da edição deste ano. Já Fernanda Diamant dedicou a abertura da feira a João Gilberto, morto neste sábado (6), e ao jornalista Otávio Frias Filho, seu marido, que morreu em 21 de agosto de 2018. Veja a programação da Flip 2019: Quinta-feira, 11 de julho de 2019 10h30 - Mesa 2: Bendegó - Aparecida Vilaça 12h - Mesa 3: Uauá - Adriana Calcanhotto, Guilherme Wisnik e Nuno Grande 15h30 - Mesa 4: Sincorá - José Miguel Wisnik 17h - Mesa 5: Bom Conselho - Kristen Roupenian e Sheila Heti 19h - Mesa 6: Serra Grande - Maureen Bisilliat 20h30 - Mesa 7: Quirinquinquá - Gaël Faye e Kalaf Epalanga 22h - Golpe de vista - Ava Rocha Sexta-feira, 12 de julho de 2019 10h - Mesa 8 (Zé Kleber): Cumbe - Marcela Cananéa e Marcelo D’Salete 12h - Mesa 9: Angico - Ayelet Gundar-Goshen e Ayobami Adebayo 15h30 - Mesa 10: Tróia de Taipa - José Murilo de Carvalho 17h - Mesa 11: Jeremoabo - Karina Sainz Borgo e Miguel Del Castillo 19h - Mesa 12: Mata da Corda - Grada Kilomba 20h30 - Mesa 13: Vaza-Barris (O Irapiranga dos Tapuias) - Ailton Krenak e José Celso Martinez Corrêa Sábado, 13 de julho de 2019 10h30 - Mesa 14: Cansanção - Marilene Felinto 12h - Mesa 15: Monte Santo - Ismail Xavier e Miguel Gomes 15h30 - Mesa 16: Poço de Cima - Grace Passô 17h - Mesa 17: Vila Nova da Rainha - Carmen Maria Machado e Jarid Arraes 19h - Mesa 18: Massacará - Sidarta Ribeiro 20h30 - Mesa 19: Cocorobó - Cristina Serra e David Wallace-Wells Domingo, 14 de julho de 2019 10h30 - Mesa 20: Santo Antônio da Glória - Braulio Tavares e Mariana Enriquez 12h30 - Mesa 21: Livro de Cabeceira- Participação especial: Amyr Klink
Fonte: G1
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